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– Erosão Linear – Sulcos, Ravinas e Boçorocas
CODAR: NI.GEV/ CODAR:
13.306
Caracterização
A
erosão linear ocorre quando o fluxo de água, arrastando partículas de solo,
concentra-se em vias preferenciais e aprofunda sulcos, dando origem a:
- ravinas, com perfil em
forma de “V” e poucos metros de profundidade;
- boçorocas, com perfil em
forma de “U” e até 50m de profundidade, 30m de largura e 1.000m de extensão.
As boçorocas constituem-se
no estágio mais avançado da erosão linear e ocorrem quando o aprofundamento das
ravinas atinge e ultrapassa o nível do lençol freático.
A interseção do fundo
da ravina com o nível do lençol freático incrementa o processo erosivo,
inclusive, da erosão interna, que remonta através do interior do terreno,
carreando material em profundidade e intensificando a formação de veios ou
tubos (pipes) vazios, no interior do solo.
Esses vazios, ao atingirem
proporções significativas, provocam colapsos e desabamentos que intensificam o
fenômeno.
Etimologicamente,
a palavra boçoroca ou voçoroca provém do tupi-guarani e pode significar:
- ibi (terra) e çoroc
(rasgada) - terra rasgada;
- mbaê (coisa) e çoroc
(rasgada) - coisa rasgada;
- mboi (cobra) e çoroci
(sulco ou rasgão) - sulco em forma de cobra.
As boçorocas são
freqüentes em países de clima tropical úmido caracterizado pela existência
de--uma estação chuvosa, na primavera-verão, e outra de estio, no
outono-inverno.
De
um modo geral, as boçorocas ocorrem em função de fatores predisponentes,
relacionados com:
- o balanço hídrico;
- a geologia;
- a pedologia;
- a geomorfologia;
- as ações antrópica.
Dessa forma, solos com texturas dominantemente
arenosas, como os de areias quartzosas e alguns solos podzólicos. em áreas
movimentadas. caracterizadas por colinas médias, morros e morretes, assentados
em formações de padrão arenoso, depositadas em terrenos neocenozóicos, são mais
propícios ao desenvolvimento de boçorocas.
Nas regiões Sul, Sudeste e
Centro-Oeste, as boçorocas ocorrem, normalmente, com maior intensidade, em
áreas cobertas pelo cerrado.
1
– Fatores Relacionados com o Balanço Hídrico
Nas fases iniciais das
erosões em sulcos e ravinas prevalece o poder erosivo, representado pelas
chuvas tropicais intensas e concentradas e pela energia cinética, representada
pelo impacto das gotas de chuva sobre a superfície do terreno.
As boçorocas e demais
processos erosivos intensificam-se em função da oposição entre períodos de
deficiência hídrica e períodos de águas excedentes.
A passagem do primeiro para
o segundo período corresponde a uma fase crítica de desequilíbrio,
principalmente quando a proteção proporcionada pela cobertura vegetal é
reduzida, facilitando a variação dos gradientes de pressão hidráulica,
relacionados com a rápida elevação do nível do lençol freático.
Segundo VIEIRA, nas áreas
planas das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil, o nível do lençol
freático decai durante sete meses e eleva-se em cinco meses, enquanto, nas
encostas, o nível decai durante nove meses e sobe, bruscamente, em três meses.
É na fase de subida rápida
do lençol freático, em função da maior infiltração, que se intensifica a erosão
interma através dos veios vazios (pipe), dos desmoronamentos e os deslizamentos
das paredes internas das voçorocas.
Conclusivamente,
as boçorocas são formas de ravinamento provocado pela combinação de processos
erosivos relacionados com:
- o escoamento superficial
da água, através de vias preferenciais, facilitando o aprofundamento de sulcos
e o ravinamento;
- a erosão interna
(pipingi) facilitando o deslizamento lateral das paredes, provocados por
subpressões em fissuras de descompressão e pela erosão remontante, seguida do
abatimento do terreno.
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- Fatores Relacionados com a Geologia
Há uma importante relação
entre depósitos neocenozóicos e susceptibilidade à erosão linear. Numerosos
estudos têm caracterizado que depósitos cenozóicos recentes, ocorridos a partir
do Pleistoceno e, especialmente, do Holoceno, constituem os substratos que
deram origem a formações arenosas superficiais, onde se concentram quase 100%
das boçorocas de evolução recente, cadastradas no Estado de São Paulo.
É muito provável que
lineamentos tectônicos profundos, atuando sobre rochas basálticas sotopostas
aos depósitos de arenitos de deposição mais recente, ao caracterizarem um
padrão profundo de drenagem sub-retangular, facilitem o desenvolvimento de
boçorocas nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste.
Nessas condições, o fluxo
hidrológico descendente, favorecido pela elevada permeabilidade e porosidade
das formações arenosas, tem seu escoamento ainda mais facilitado pelas fraturas
das rochas basálticas.
3-
Fatores Relacionados com a Pedologia
As boçorocas ocorrem
preferencialmente em solos de padrão arenoso, semiconsolidados ou
inconsolidados, de origem cenozóica, preferencialmente quando o horizonte “B” é
argiloso e de tipo podzólicos.
As boçorocas afetam toda a
estrutura de rochas alteradas, inclusive a de estratos de formação anterior á
era cenozóica.
Os solos arenosos
profundos e francamente permeáveis, como os solos aluviais pouco desenvolvidos
e as areias quartzosas, são os mais propícios á erosão linear, especialmente quando
a cobertura vegetal, normalmente de cerrado, é destruída por queimadas.
Esses solos costumam
existir em mantos de decomposição, originados a partir de rochas cristalinas
grosseiras, ou pela decomposição de gnaisses, com grandes percentagens de
areias.
Nas regiões Sul, Sudeste e
Centro-Oeste, de um modo muito típico, os solos derivados de arenitos, com
conglomerados de varvitos e tilitos, relacionados com as glaciações, são
propícios ao ravinamento e formações de boçorocas.
4
- Fatores Relacionados com a Geomorfologia
Os fatores geomorfológicos
exercem uma importante influência indireta no desenvolvimento de boçorocas. Os
terrenos movimentados, caracterizados por colinas de médio e grande porte,
morros e morretes, são mais propícios ás erosões em ravinas e boçorocas.
A grande maioria das
erosões lineares ocorre em encostas de perfil convexo e tende a predominar
naquelas com curvas de nível côncavo, ou seja, em encostas de padrão coletor,
podendo ocorrer, em menor número, em encostas com curvas de nível convexas, ou
seja, em encostas de padrão dispersor.
É evidente que os fatores
geomorfológicos só são importantes, quando combinados com os relativos ao solo
e à geologia.
5-
Fatores Antrópicos
A
erosão linear é intensificada pelas atividades humanas inadequadas, em áreas
de:
- urbanização;
- construção de vias de
transporte;
- manejo agropecuário.
Urbanização
Inadequada
A
formação de ravinas e boçorocas nos perímetros urbanos, situados em áreas de
risco, relacionam-se com:
- deficiente zoneamento do
solo urbano, em função dos riscos de erosão linear;
- ruas não pavimentadas e
drenadas, especialmente nas áreas de risco intensificado,
- despejo de águas
pluviais, coletadas e aduzidas em cabeceiras de drenagem;
- concentração da vazão de
águas pluviais e de despejo, em função do processo de urbanização, compactação
e impermeabilização do solo, em áreas susceptíveis á erosão linear;
- lançamento de águas
pluviais e de despejo nos leitos de riachos urbanos, incrementando o potencial
erosivo dos mesmos.
Construção de Vias de Transporte
De
uma forma genérica, as erosões em obras viárias podem ocorrer em:
- plataformas;
- taludes dos cortes;
- taludes dos aterros,
- áreas adjacentes ao
corpo da estrada.
Em
áreas sujeitas às erosões, as obras viárias podem incrementar os processos
erosivos, em função dos seguintes fatores:
- mudança das
características naturais do terreno, com a execução de cortes e aterros;
- bloqueio da drenagem
natural pela implantação da plataforma e desvio e concentração do fluxo da água para os pontos mais
baixos do talvegue, onde se localizamos bueiros e as pontes;
- desmatamento e
destocagem da faixa viária e das áreas de empréstimo dos aterros.
Manejo Agropecuário Inadequado
Nas regiões Sul, Sudeste e
Centro-Oeste, as áreas mais susceptíveis à erosão linear são normalmente
cobertas pelo cerrado.
Nas
áreas de risco, a erosão linear, que dá origem ás ravinas e boçorocas, é
intensificada pelas seguintes atividades antrópicas:
- redução da cobertura arbórea
e/ou arbustiva, especialmente nas linhas de cumeadas e nas encostas íngremes;
- abertura de sulcos ou de
vias de circulação em sentido transversal ao das curvas de nível;
- uso exagerado de
tratores, provocando a compactação dos horizontes mais profundos e contribuindo
para a intensificação do escoamento superficial;
- técnicas agrícolas que
desnudem o solo, facilitando a ação desagregadora, provocada pelo impacto das
gotas de chuva sobre a superfície do terreno;
- criação intensiva de
bovinos e outros animais domésticos em áreas de colinas arenosas, especialmente
quando a densidade dos mesmos ultrapassa a capacidade de sustentação das
pastagens e quando o pisoteio contribui para a abertura de sulcos,
facilitadores da erosão linear;
- prática de queimadas
que, além de destruírem a cobertura vegetal, destroem a camada viva,
representada pelo húmus, e coagulam os colóides orgânicos, capazes de reter
grandes quantidades de água em sua fase gel, facilitando a infiltração e o
escoamento superficial da água. Não existe prática mais irracional do que a
queimada, por seu imenso potencial de degradação do solo.
Medidas
Preventivas
O conhecimento detalhado
da dinâmica e das peculiaridades de cada processo erosivo, que se pretenda
prevenir ou controlar, da mesma forma que a avaliação sistemática do desempenho
das medidas preventivas e das obras de controle, é essencial ao planejamento e
gerenciamento de projetos, eficazes e econômicos, relacionados com a prevenção
e o controle do ravinamento e das boçorocas.
1
- Boçorocas Urbanas
A prevenção de boçorocas
urbanas depende de consistentes estudos de riscos, do mapeamento das áreas de
risco intensificado de erosão linear, do zoneamento urbano e da elaboração de
normas relativas às condições de utilização do solo urbano e da fiscalização,
para assegurar o fiel cumprimento das mesmas.
A
implantação de obras corretivas de processos erosivos profundos, em áreas
urbanas, segue a seguinte seqüência:
- pavimentação das ruas,
especialmente das mais susceptíveis aos processos erosivos;
- microdrenagem, através
da construção de estruturas coletoras, como sarjetas e bocas-de-lobo, e de
condutos de ligação, poços de visita e outras obras;
- microdrenagem, através
da construção de estruturas adutoras, como tubulações e canais a céu-aberto;
- construção de estruturas
dissipadoras de energia cinética;
- construção de estruturas
estabilizadoras dos vales receptores e talvegues, como barragens escalonadas de
terra compactada, de gabiões, de pedras secas, de concreto e de sacos
plásticos, cheios de solo-cimento, areia ou concreto.
2
- Boçorocas em Áreas Rurais
No meio rural, as práticas
conservacionistas, para serem efetivas, devem ultrapassar o nível das
propriedades e ser coordenadas, em nível de microbacias.
Nessas condições, todos os
proprietários de terra, com o apoio de uma assessoria técnica, devem
desenvolver um plano de manejo integrado da microbacia, que passa a ser
obrigatoriamente seguido por todos.
O manejo integrado reduz
as erosões linear e laminar, aumenta ~ fertilidade natural do solo e a
produtividade de todas as propriedades.
As
mais importantes medidas preventivas são:
- manutenção e recuperação
da cobertura do solo, com árvores e arbustos, especialmente nas linhas de
cumeadas, nas encostas íngremes, nas matas ciliares e nas matas de proteção de
nascentes e de olhos d’água;
- manutenção do solo
agricultável permanentemente protegido por cobertura verde, restos culturais,
palhadas, serragens ou outros;
- prática do rotação de
culturas, segundo as faixas do terreno;
- redução do revolvimento
do solo ao mínimo indispensável, procurando fazê-lo apenas nas épocas de
plantio;
- redução do tráfego de
tratores ao estritamente necessário;
- plantio segundo as
curvas de nível e implantação, quando for o caso, de sistemas de terraceamento;
- planejamento e
implantação racional de estradas vicinais, com eficientes sistemas de drenagem,
e construção de bacias de captação, de acordo com técnica preconizada por ACRA;
- sempre que possível,
utilizar técnicas de plantio direto e adubação orgânica;
- absoluta proibição de
queimadas.
A
correção de boçorocas no meio rural assemelha-se á das zonas urbanas e é
desenvolvida na seguinte seqüência:
- proteção das cabeceiras
de drenagem, com revestimento vegetal;
- isolamento da área da
boçoroca;
- desvio das águas de
superfície, através da construção de terraços ou vaias de desvio, devidamente
compactados e protegidos por vegetação;
- sistematização dos
taludes e construção de aterros em sentido transversal;
- construção de barragens
temporárias de contenção, com teias de arame, ramos de árvores e pedras secas;
- construção de barragens
permanentes de contenção, como aterros compactados e barragens de sacos
plásticos, contendo solo-cimento, areia ou concreto;
- construção de
vertedouros, com dissipadores de energia.
3
- Boçorocas em Obras Viárias
A
prevenção da erosão, provocada por obras viárias, depende da construção de:
- sarjetas revestidas por
concreto ou grama, com dissipadores de energia nas plataformas de aterro;
- canais mais profundos,
quando ultrapassada a capacidade de escoamento das sarjetas;
- valetas de proteção das
cristas de cortes e saias de aterro, com dissipadores de energia;
- barragens e bacias de
acumulação ao longo do curso das sarjetas e valetas, para reduzir a velocidade
do deslocamento d’água;
- dissipadores de energia,
junto ás saídas de jusante dos bueiros;
- proteção dos taludes de
cortes e de aterros, com vegetação;
- proibição da rapina dos
taludes;
- drenagem profunda;
quando for necessário, deprimir o nível da água dos lençóis freáticos.
Para um maior detalhamento de obras de
prevenção e de recuperação, sugere-se a leitura de textos especializados.
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