ESPECULAÇÃO
CODAR
– HS.CES/CODAR – 22.202
1. Caracterização
Ocorre
especulação quando uma das partes de um negócio abusa da boa fé ou de uma
situação desvantajosa da outra para auferir lucros, de forma antiética.
Normalmente,
a tendência para a especulação se intensifica, quando ocorrem desastres
naturais e humanos, na condição de um desastre secundário, quando estes eventos
adversos contribuem para desestabilizar o mercado.
É
importante caracterizar que a natureza humana é imperfeita e que as motivações
comportamentais, relacionadas com condutas altruístas, são tão freqüentes
quanto as relacionadas com condutas egoístas e pouco éticas.
É
interessante registrar que crianças incentivadas a participar de jogos
altamente competitivos não titubeiam em agir desonestamente todas as vezes que
imaginam que não estão sendo fiscalizadas.
Embora
individualmente os seres humanos sejam dominantemente egoístas, os mecanismos
de solidariedade e de auto-censura, existentes nos grupos comunitários coesos e
bem estruturados, promovem comportamentos sociais dominantemente altruístas.
Para
coibir a especulação e outros comportamentos sociais pouco éticos, é necessário
que se estimule a formação de grupos comunitários fortes, coesos e cidadãos e
que se estabeleça uma sadia cumplicidade com estes grupos de pressão, com o
objetivo de coibir ou minimizar os efeitos dos comportamentos antiéticos e
egoístas dos especuladores.
2. Causas
A especulação, especialmente com
produtos alimentícios e com outros produtos básicos de consumo obrigatório,
atua como fator de agravamento dos quadros de desequilíbrio social e
relaciona-se com:
- deficiência nos processos de produção,
armazenamento, circulação e comercialização de bens;
- perdas, por desperdícios, na colheita, na
estocagem, na distribuição e no consumo de alimentos. De acordo com dados do
IBGE e da Fundação Getúlio Vargas (1991), aproximadamente 30% dos alimentos
produzidos no Brasil são desperdiçados, entre a colheita e o consumo final;
- rejeição de produtos comercializados, por
problemas relacionados com deficiência no controle de qualidade e com o uso de
técnicas arcaicas e ultrapassadas na produção destes produtos.
3. Ocorrência
A
especulação é fruto do imediatismo e da prepotência e tende a intensificar-se
nas sociedades fechadas, onde o livre comércio e a concorrência são bloqueados
por mecanismos artificiais.
Em
conseqüência de desastres de grandes proporções, que tendam a desequilibrar as
economias regionais, a especulação é estimulada.
No
entanto, o processo inflacionário é o mais importante fator isolado que atua
como estimulador da especulação.
A
estabilidade da moeda, ao contrário, acaba despertando a consciência da força
do mercado consumidor para atuar como antídoto das pressões especulativas.
De
qualquer forma, o aperfeiçoamento da legislação, que funciona como Código de
Defesa do Consumidor, é de importância capital para reduzir a especulação.
4. Principais Efeitos Adversos
Na
condição de desastre secundário, a especulação contribui para incrementar os
danos e os prejuízos causados pelos desastres principais.
Como
os estratos sociais menos desenvolvidos são os mais vulneráveis às manobras
especulativas, este desastre secundário contribui enormemente para incrementar
as desigualdades sociais e regionais.
Ao desestimular a produção e o
consumo, a especulação, quando desenfreada, concorre para reduzir o
desenvolvimento econômico e social, e relaciona-se com a (o):
- retenção de estoques, objetivando a redução da
oferta de determinados produtos e o desencadeamento de pressões altistas,
relacionadas com a aquisição e o consumo dos mesmos;
- crescimento desnecessário da cadeia de
intermediação entre os produtores e os consumidores finais;
- predominância do poder econômico do
comerciante intermediário que, ao adquirir do produtor, força os preços para
baixo e, ao vender ao varejista, força os preços para cima.
A visão imediatista de muitos
comerciantes atacadistas pode prejudicar todo o processo econômico ao:
- desestimular a produção;
- desencorajar o consumo.
É
provável que arcanos mentais, desenvolvidos ao longo dos 322 anos em que o
Brasil foi colônia de Portugal, expliquem a tendência para a exacerbação da
especulação no País. Na época do Brasil colônia, os reinóis aportavam o país,
com o objetivo de enriquecer, no mais curto prazo possível, e retomar a
Portugal em condições de gozar da riqueza acumulada.
Esta
motivação explica a especulação e os comportamentos predadores da época e que
foram incorporados parcialmente pelo inconsciente coletivo dos nacionais.
Infelizmente,
os 180 anos de independência (2002) não foram ainda suficientes para que estes
arcanos mentais fossem varridos do inconsciente coletivo e muitos comerciantes
atacadistas continuam a atuar como reinóis predadores da sociedade brasileira,
da qual não se sentem parte integrante.
5. Monitorização, Alerta e Alarme
O
estudo das tendências altistas permite que se infira a importância relativa dos
processos especulativos dentro de uma sociedade.
O
nível de abertura de uma sociedade, com relação ao comércio global influi
poderosamente na redução dos mecanismos especulativos.
Nestas
condições, a monitorização dos preços de bens e de serviços e o estudo da
legislação, que tem o objetivo de proteger determinados segmentos do mercado
interno permite inferir sobre o nível de especulação.
Outro
fator que permite monitorizar o fenômeno é o estudo do grau de organização das
associações de consumidores. Quanto mais forte for a consciência do poder de
pressão do mercado consumidor, menor será a capacidade dos especuladores para
atuar em prejuízo do processo socioeconômico.
6. Medidas Preventivas
A
visão simplista de que a sociedade se organiza economicamente, segundo camadas
horizontais de espessuras decrescentes, é pouco útil e está ultrapassada. Esta
visão só interessa para ser mantida por governos de índole predadora.
Na
realidade, a sociedade moderna organiza-se em torno de grupos de pressão, que
se caracterizam por seus interesses homogêneos e concordantes. Nestas
condições, em função de seus interesses sociais, econômicos e culturais, um
mesmo indivíduo pode associar-se a mais de um grupo social devidamente
estruturado.
O
primeiro “board’ ou câmara de coordenação de atividades de produção e
comercialização de um conjunto de bens foi o da bacia leiteira de Londres. Este
“board”, estruturado no século XVIII, estende-se nos dias atuais por toda a
Grã-Bretanha e deu origem às modernas câmaras de coordenação de nossos dias.
Da
mesma forma que as câmaras setoriais ou “boards” de produtores e de mecanismos
similares, que geraram centrais de vendas unificadas e associações de
comerciantes varejistas, com centrais de compras unificadas, é possível
promover “boards” de consumidores e “associações de donas-de-casa” responsáveis
pelo desencadeamento de mecanismos de pressão contra os processos
especulativos.
A
estruturação da sociedade em câmaras e associações de produtores, de
comerciantes varejistas e de consumidores concorre para o equilíbrio dinâmico
do mercado e para desencorajar a especulação, forçando a modernização do
comércio atacadista.
Em termos muito genéricos, para coibir
a especulação é necessário:
- fazer cumprir a legislação que controla e
minimiza os abusos do poder econômico, com o objetivo de coibir comportamentos
comerciais pouco éticos, na busca do lucro excessivo;
- estimular a formação de grupos comunitários
coesos e com poder de pressão suficiente para se contraporem aos interesses de
grupos pouco éticos, inclusive de especuladores. As associações de “donas de
casa” são bons exemplos destes grupos comunitários que podem comandar retrações
de aquisições de produtos que sofreram pressões especulativas.
Na
medida em que a estabilidade da moeda gerar no consumidor esclarecido a
consciência de seu imenso poder, os preços serão mais facilmente controláveis.
Nestas
condições, a globalização da economia é um fator preponderante para minimizar
os efeitos da especulação.
As
atuais medidas de controle de inflação e de estabilização da moeda estão
concorrendo para reequilibrar o mercado e minimizar a especulação.
A abertura do mercado brasileiro ao
comércio internacional está provocando um choque de renovação, que está
concorrendo para:
- o fortalecimento das empresas que se
modernizarem;
- o enfraquecimento do poder das empresas
retrógradas que insistirem em manter comportamentos arcaicos e imediatistas.
É
muito importante caracterizar que uma das mais importantes vulnerabilidades do
sistema econômico brasileiro relaciona-se com a circulação de mercadorias e que
os fretes excessivamente elevados, concorrem para aumentar o chamado “custo
Brasil” e para reduzir a competitividade dos produtores brasileiros. É
importante que as vias de circulação de mercadorias sejam modernizadas e que o
custo dos fretes seja substancialmente reduzido.
A modernização da produção depende
fundamentalmente do esforço concentrado relacionado com:
- o aumento da produtividade;
- a redução do desperdício de insumos ao longo
das linhas de montagem;
- a valorização do controle de qualidade;
- a redução dos custos de produção.
O
crescimento do poder dos grupos de consumidores, produtores e de comerciantes
varejistas concorrerá para a modernização das atividades de intermediação e de
circulação de mercadorias e para a redução das tendências especulativas.
Na
medida do possível, a responsabilidade pelo financiamento dos estoques
reguladores deverá ser repassada para as câmaras setoriais, dos diferentes
“boards” de produtores, apoiados pelo Sistema bancário e pelas chamadas “bolsas
de commodities” e, em caráter mínimo, pelo próprio governo.
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