A sessão começou
Longo fora enumerar tudo o que se passou em duas horas
muito agradáveis e por isso muito breves, também. Toda a companhia veio tomar
parte naquele divertimento improvisado e até, quem o diria?!, os dois velhos
deixaram o tabuleiro do gamão! Resuma-se alguma coisa. As testemunhas foram D.
Gabriela e uma outra, que deram provas de bastante espírito. O interrogatório
de D. Carolina fez rir a quantos o ouviram. O debate dos advogados esteve
curioso. Leopoldo acusou a ré, demonstrando que tinha havido a circunstância
agravante da premeditação e que o crime se tornava ainda mais feio, por ser
causado pelo ciúme; procurou provar que D. Carolina, cônscia de seus encantos e
beleza, queria ser senhora absoluta de todos os corações e até de todos os
seres, que ela se enchera de zelos supondo, com razão, que Augusto desse subido
valor à rosa, por lhe ser dada por uma moça bela como a autora e, enfim, que o
ciúme da ré era tão excessivo, que já na tarde antecedente jurara a perda
daquela flor, por desconfiar que o zéfiro brincava mais com ela do que com seus
olhos. Filipe não se deixou ficar atrás. Argumentou dizendo que era impossível
decidir que mão tinha dado a morte à bela cativa, que não houvera premeditação,
porque a ré não quisera matar mas, sim libertar; que, se havia crime, só o
cometera a autora, por prender uma inocente flor; e que, por último, ainda
quando fosse a ré que desfolhara a rosa e mesmo dando-se o propósito de o
fazer, dever-se-ia atribuir tal ação à piedade, pois que D. Quinquina a estava
matando pouco a pouco com o veneno da inveja, colocando-a tão perto de suas
faces, que tanto a venciam em rubor e viço.
As juradas recolheram-se à toilette e cinco minutos
depois voltaram com a sentença, que foi lida por D. Clementina. O júri declarou
D. Carolina criminosa e a condenou a indenizar o dono da rosa com um beijo.
- Para fazer tal, disse a ré, não carecia eu de
sentença do júri; tome um beijo, minha prima...
- Não é a mim que o deve dar, respondeu a autora; o
dono da rosa é o Sr. Augusto.
De rosa fez-se então o rosto de D. Carolina.
- O beijo! o beijo! gritaram as juradas. Você deu sua
palavra!
Ela hesitou alguns momentos... depois, aproximou-se de
Augusto e, com seu sorriso feiticeiro e irresistível nos lábios, disse:
- O senhor me perdoa?...
- Não! Não! Não! - clamaram de todos os lados.
Mas a menina parecia contar com o poder de seus
lábios, porque, sorrindo-se ainda do mesmo modo, tornou a perguntar com
meiguice e ternura:
- Me perdoa?...
- Não! não!
- Porém, como resistir ao seu sorriso?... como dizer
que não a quem pede como ela?... exclamou Augusto, entusiasmado.
D. Carolina estava, pois, perdoada.
- Agradecida! disse ela com vivo acento de gratidão e
estendeu sua destra para Augusto que, não podendo ceder tudo com tão criminoso
desinteresse, tomou entre as suas aquela mãozinha de querubim e fez estalar
sobre ela o beijo mais gostoso que tinham até então dado seus lábios.
A manhã deste dia foi assim passada; e á tarde
voltou-se aos preparativos do sarau.
Nenhum comentário:
Postar um comentário