À ILHA DE MARÉ TERMO
DESTA CIDADE DA BAHIA SILVA
1
Jaz oblíqua forma, e prolongada
A terra de Maré toda cercada
De Netuno, que tendo o amor constante,
Lhe dá muitos abraços por amante,
E botando-lhe os braços dentro dela
A pretende gozar, por ser mui bela.
Nesta assistência tanto a senhoreia,
E tanto a galanteia,
Que do mar de Maré tem o apelido,
Como quem preza o amor de seu querido:
E por gosto das prendas amorosas
Fica maré de rosas,
E vivendo nas ânsias sucessivas,
São do amor marés vivas;
E se nas mortas menos a conhece,
Maré de saudades lhe parece.
Vista por fora é pouco apetecida,
Porque aos olhos por feia é parecida;
Porém dentro habitada
É muito bela, muito desejada,
É como a concha tosca, e deslustrosa,
Que dentro cria a pérola fermosa.
Erguem-se nela outeiros
Com soberbas de montes altaneiros,
Que os vales por humildes desprezando,
As presunções do Mundo estão mostrando,
E querendo ser príncipes subidos,
Ficam os vales a seus pés rendidos.
Por um, e outro lado
Vários lenhos se vêem no mar salgado;
Uns vão buscando da Cidade a via,
Outros dela se vão com alegria;
E na desigual ordem
Consiste a fermosura na desordem.
Os pobres pescadores em saveiros,
Em canoas ligeiros,
Fazem com tanto abalo
Manuel Botelho
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