Brasília – Duas pesquisas desenvolvidas no Brasil buscam a
produção de medicamentos para diagnóstico e imunização da população contra os
quatro tipos de dengue a partir da modificação genética de plantas.
Na Universidade Estadual do Ceará, o Laboratório de
Bioquímica Humana usa o feijão de corda para produzir a proteína do vírus da
dengue e obter a vacina. Na Universidade de Brasília (UnB), o Departamento de
Biologia Celular tenta produzir uma parte do vírus da dengue com alface e criar
um reagente para detectar a doença.
A intenção dos pesquisadores da UnB é montar um kit para
diagnóstico que seja mais barato do que o de origem animal (camundongo) e que o
Brasil precisa importar parte da Austrália. O kit terá um reagente produzido
com alface na qual foi injetado o gene do vírus da dengue. A alface transgênica
produzirá uma partícula viral defeituosa que será aproveitada em reagente, a
ser misturado ao sangue coletado. Conforme a reação, o medicamento indicará se
o paciente está com os anticorpos do vírus da dengue.
Segundo o pesquisador Tatsuya Nagata, virologista do
Laboratório de Microscopia, ligado ao Departamento de Biologia Celular da UnB,
a alface é mais eficiente do que bactérias e leveduras tradicionalmente usadas
na produção de vacinas. “Bactérias e leveduras têm um sistema celular mais
primitivo do que o da alface. O sistema celular da planta é mais próximo do dos
seres humanos”, diz.
Nagata afirma que há vantagens em usar um vegetal em vez
de reagentes extraídos diretamente de animais. Primeiro, é o fato de, não
usando animais na pesquisa, não ter de sacrificá-los. A outra vantagem é que os
técnicos de laboratório não correm risco de contaminação no momento de aplicar
a injeção nos camundongos.
A pesquisa com reagentes ainda tem ainda dois anos de
prazo, e os insumos serão testados em sangue infectado pela dengue e já
armazenado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). As alfaces geneticamente
modificadas são mantidas em local seguro e separado. Nagata não descarta a
hipótese que, no futuro, a própria alface possa ser utilizada como vacina. “A
metodologia está sugerindo isso, mas [a ideia] ainda não é aceita pelos especialistas
em vacinação,porque a dosagem tem que ser corretamente medida.”
No caso do feijão de corda, o propósito é retirar,
diretamente da planta, a proteína para a vacina. “Nós inserimos em um vetor os
genes que produzem a proteína E do envelope dos quatro sorotipos do vírus da
dengue. Em seguida, os introduzimos dentro das células da planta", explica
a a bioquímica Maria Izabel Florindo Guedes, responsável pela pesquisa na
Universidade Estadual do Ceará.
De acordo com Maria Izabel, à medida que as plantas
crescem, as proteínas do vírus da dengue vão se multiplicando. É como se a
planta se transformasse em uma biofábrica de grandes quantidades de proteínas
do vírus da dengue. Após alguns dias, as plantas são coletadas, trituradas e as
proteínas do vírus são extraídas (purificadas), acrescentou a bioquímica.
Segundo ela, as proteínas “candidatas vacinais” já foram
usadas na imunização de camundongos. “Os resultados obtidos até o momento
mostram que, devido aos altos títulos de anticorpos induzidos pelas proteínas
heterólogas [compostas] produzidas em plantas, a proposta é viável e poderá
abrir perspectivas para a produção da primeira vacina eficaz e de baixo custo
contra a dengue.”
Como se trata de um medicamento para imunização de
pessoas, a vacina extraída do feijão de corda geneticamente modificado ainda
passará por extenso estudo clínico, que ainda não tem previsão para começar,
informa a pesquisadora responsável. Para ser usado no Brasil, todo medicamento
tem de ser registrado na Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa).
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