14 julho 2024

A tragédia - A Kiss antes do incêndio Publicado em 06/12/2021

 A tragédia

 

O incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria – RS, aconteceu na madrugada de 27 de janeiro de 2013 e matou 242 pessoas, em sua maioria jovens.

 

Além disso, outras 636 vítimas ficaram feridas e precisaram de atendimento e acompanhamento a longo prazo.

 

O fogo começou durante o show da banda Gurizada Fandangueira, que usava artefatos pirotécnicos. 

 

A casa noturna, que estava lotada e não tinha ventilação, saídas de emergência nem controle de incêndio, foi tomada pela fumaça tóxica proveniente da queima da espuma acústica.

 

Os extintores não funcionaram, não havia chuveiros automáticos – também chamados de sprinklers – nem indicação da rota de fuga.

 

Além disso, obstáculos como degraus, barras de ferro e muretas agravaram a dimensão da tragédia, uma vez que muitas pessoas tropeçaram, caíram ou ficaram presas ao tentar cruzar por elas.

 

Gabriel Rovadoschi Barros, 27 anos, é psicólogo e não foi chamado como testemunha do júri, mas com o dispositivo conseguiu mostrar para a família o local em que estava quando começou o incêndio.

 

Ele presenciou a coletiva de imprensa sobre o julgamento, em que a ferramenta foi entregue ao Ministério Público, no dia 17 de novembro.

 

Durante a apresentação na coletiva, o percurso virtual foi pausado para mostrar um exemplo de local em que havia sinalização, mas o extintor de incêndio estava ausente.

 

No salão menor, ao lado de uma cabine de madeira, Gabriel estava parado quando percebeu a movimentação de pessoas correndo. De lá, ele não viu o início do incêndio.

 

Cabine de madeira, local onde Gabriel Rovadoschi Barros estava quando começou o incêndio.

 

Primeiramente, ele achou que fosse uma briga, mas, quando percebeu a fumaça, colocou a camiseta na frente do nariz e correu... ...não gritou para poupar energias... ...e tropeçou nos degraus que separavam os ambientes.

 

Para Gabriel, elementos como barras de ferro, mesas e degraus que estavam no caminho dificultaram a saída de muitas pessoas.

 

"Não tinha outra saída. Não tinha uma porta nos fundos. Não tinha uma janela para quebrar. Não tinha nada”, relembra.

 

Gabriel não conhecia muito bem a boate, na época com 18 anos e estudante de Jornalismo na UFSM, era a segunda vez que ia até a Kiss.

 

A primeira foi na noite anterior, em que conheceu uma menina do curso de Zootecnia que o convidou a ir à festa Agromerados, segundo ele, a fila do dia 26 estava maior que a do dia anterior.

 

Gabriel não teve sequelas físicas e pulmonares: apenas um hematoma roxo na perna, em formato de dedos, marcou a pele.

 

Dos quatro amigos, dois faleceram e dois ficaram internados.

 

A culpa por ter saído sem sequelas o acompanhou durante muito tempo. “Uma das coisas que mais me afeta até hoje é que no início do tumulto eu senti que peguei o lugar de alguém”.

 

Entre silêncios, suspiros e voz afetada, ele afirma que hoje consegue reconhecer que essa não deve ser uma culpa dele. “Teve responsáveis por isso. Foi uma emboscada, um crime, acho que não tem outra palavra para definir”, diz.

 

Para Gabriel, o dispositivo é importante porque deu respostas de coisas que estavam só na lembrança. “Ao mesmo tempo que dói [rever], alivia, porque eu me dou conta de que não estava louco, que eu não aumentei a dificuldade da coisa, que ela foi mais difícil ainda do que eu imaginava”, desabafa.

 

Ele acredita que o recurso é potente, mas não só como ferramenta para ser usada no júri: “Vai ajudar, para servir como recurso, para entender, para dar lugar, para tirar esse peso que eu tenho em ser a memória da tragédia, acho que desloca e dá outras funções além de comprovar o absurdo que foi”.

 

Na busca por memória e justiça, a atuação de uma ONG quer conscientizar a população para que outras tragédias não aconteçam.

 

A “Kiss: Que não se repita” (KQNSR) é ativa nas redes sociais e luta para que a tragédia não caia no esquecimento.

 

Bel Bonotto, 33 anos, é do Rio de Janeiro e faz parte da equipe de comunicação da KQNSR, no incêndio, ela perdeu um amigo.

 

A publicitária afirma que o dispositivo é uma maneira didática de evidenciar, para quem nunca esteve na boate como ela era um labirinto e tinha vários pontos cegos.

 

 “Através do dispositivo, é possível mostrar com clareza como era difícil ter noção de onde era a saída, ainda mais com a fumaça tomando conta do espaço no escuro, e também das debilidades – como a ausência do extintor de incêndio e do quanto a espuma tóxica dominava a área onde o artefato pirotécnico foi aceso”.

 

No corredor que levava ao exterior, acima da porta deveria ter um aviso de “saída”; no entanto, a placa indicava o “caixa”.

 



Nenhum comentário:

Postar um comentário