Anatomia e locomoção das
cobras
Os
órgãos internos das cobras são muito parecidos com os de outros vertebrados,
mas sofreram modificações anatômicas para se ajustarem ao formato cilíndrico e
alongado de seu corpo.
Alguns
órgãos, que geralmente ocorrem em pares em outros animais, foram perdidos ou
consideravelmente reduzidos nas cobras.
Os
pulmões, por exemplo, são órgãos que necessitam de espaço para expandirem
durante a respiração.
Possuir
dois pulmões expandindo a cada ciclo respiratório poderia ser um problema para
as cobras, em função do espaço interno reduzido do seu corpo.
Esse
problema foi resolvido, com a redução de tamanho ou a perda completa do pulmão
esquerdo.
Para
compensar essa perda e garantir que as trocas gasosas sejam realizadas com
eficiência, o pulmão direito de todas as cobras é grande e bem desenvolvido.
As
gônadas (testículos e ovários) geralmente ocorrem em pares, localizados nas
laterais da porção posterior do corpo, mas em algumas espécies fossoriais de
corpo muito delgado, uma das gônadas foi perdida, como em Tantilla
melanocephala, espécie que pode ser encontrada na região de Manaus.
Também
adaptado ao formato cilíndrico e alongado do corpo das cobras, o estômago é uma
continuação do esôfago, e é difícil distingui-los.
O
fígado é alongado e bilobado. Assim como outros lagartos e aves, as cobras não
possuem bexiga urinária, elas excretam ácido úrico, uma substância mais sólida
que a urina. Essa é uma adaptação contra a perda excessiva de água.
A
temperatura do ambiente é um fator importante para a vida das cobras, porque
elas são ectotérmicas.
Isso significa que não podem manter altas temperaturas corporais por meio de processos químicos internos, iniciados com a energia obtida dos alimentos, como fazem os mamíferos e as aves.
Algumas espécies de Pítons podem aumentar a
temperatura corpórea por contrações musculares, mas geralmente elas fazem isso
apenas para incubar os ovos. Assim como outros lagartos, as cobras são
excelentes termorreguladoras.
Graças
ao seu corpo alongado, a área de superfície é bastante grande em relação à
massa corporal, por isso elas podem rapidamente tirar vantagem de fontes
externas de calor.
Pelo
mesmo motivo, as cobras podem ganhar ou perder calor muito rapidamente em condições
extremas, e portanto, geralmente não ocorrem em regiões com temperaturas muito
elevadas ou muito baixas, mas existem exceções. Muitas cobras, como a víbora
Bitis peringueyi, vivem em desertos escaldantes, e outras vivem em ambientes
muito frios, como a víbora européia Vipera berus.
Em
temperaturas muito baixas para a termorregulação, as cobras procuram abrigos e
se mantêm em baixas temperaturas corporais até que as condições climáticas
melhorem.
Pouquíssimos
mamíferos ou aves são capazes de fazer isso, e a maioria das espécies morreria
se a temperatura corporal caísse tanto quanto as temperaturas experimentadas
por cobras, inclusive nas regiões tropicais.
Algumas
estratégias para manter a temperatura do corpo foram desenvolvidas pelas
cobras, como enrodilhar o corpo para reduzir a perda de calor (Figura 7) ou
usar a circulação sanguínea para concentrar a energia disponível para aquecer
órgãos vitais específicos, o que permite com que elas mantenham o calor que
obtêm de fontes externas.
Figura
7 - Jararaca-pintada Bothriopsis taeniata com o corpo enrodilhado. Essa postura
torna a cobra confundível com uma folha caída, mas possivelmente também ajuda a
manter a temperatura do corpo. Esta espécie possivelmente não ocorre na região
de Manaus.
As
cobras usam eficientemente as fontes de calor disponíveis no ambiente, e isso
provavelmente explica os números maiores de espécies e indivíduos em comparação
aos mamíferos, em diversas partes do mundo.
A
coluna vertebral das cobras é consideravelmente maior do que a de outros
vertebrados, e tem a função de suportar as costelas e os músculos, que
juntamente com a pele e a disposição das escamas, formam um complexo mecânico
responsável pela locomoção.
Apesar
de não possuírem patas, as cobras se movimentam rapidamente, e possuem
adaptações para escalar, cavar e nadar (Figura 8).
A
maioria das cobras se desloca por ondulações laterais do corpo, a partir de
contrações de músculos dispostos em lados opostos da coluna vertebral.
As
contrações ocorrem em ciclos que seguem a direção da porção anterior (cabeça)
para a porção posterior do corpo (cauda).
Por apresentarem o corpo relativamente mais robusto, algumas cobras como Jiboias (Boa constrictor) e Surucucus-pico-de-jaca (Lachesis muta) não conseguem realizar essas ondulações laterais.
Elas utilizam um movimento semelhante ao de
lagartas, com contrações na superfície ventral do corpo, formando ondas
regulares na pele. Essas ondas percorrem todo o corpo na direção cabeça-cauda, impulsionando
o animal para frente ou para cima.
A
locomoção também sofreu adaptações interessantes em ambientes extremos.
Por
exemplo, para se locomoverem por sobre a areia escaldante de desertos, algumas
cobras conseguem manter apenas dois pontos de apoio entre o corpo e o
substrato.
Alternando
pontos diferentes do corpo, elas conseguem evitar contato prolongado com a
areia, quente suficiente para lhes causar ferimentos.
O
solo arenoso do deserto não permite a manutenção de túneis subterrâneos, mas algumas
cobras conseguem realizar movimentos semelhantes à natação por baixo da areia,
para evitar exposição excessiva ao calor extremo.
Cobras marinhas geralmente possuem a cauda achatada (comprimida lateralmente) e a utilizam como um leme de barco, para direcionar a natação.