VI - Acidentes por Coleópteros
1. Introdução
Vários gêneros de coleópteros podem provocar quadros
vesicantes. A compressão ou atrito destes besouros sobre a pele determina um
quadro dermatológico, decorrente da liberação, por parte do inseto, de substâncias
tóxicas de efeito cáustico e vesicante. O contato ocorre, muitas vezes, nas
proximidades de luz artificial para a qual são fortemente atraídos. São
descritas em torno de 600 espécies no mundo, sendo mais de 48 sul-americanas.
Já foram registrados surtos epidêmicos.
2. Coleópteros de importância médica
No Brasil, são descritos os acidentes por besouros do
gênero Paederus (Coleoptera,
Staphylinidae) nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e pelo gênero Epicauta (Coleoptera, Meloidae)
no estado de São Paulo.
O gênero Paederus
(potó,
trepa-moleque, péla-égua, fogo-selvagem)
compõe-se de pequenos besouros de corpo alongado, medindo de 7 mm a 13 mm de
comprimento (fig. 64); possuem élitros curtos, que deixam descoberta mais da
metade do abdome. Vivem em lugares úmidos, arrozais, culturas de milho e
algodão.
Cinco espécies de Paederus
são associadas a acidentes humanos
no Brasil: P. amazonicus, P.
brasiliensis, P. columbinus, P. fuscipes e P. goeldi.
São espécies polífagas, predadoras de outros insetos,
nematódeos e girinos. Quando molestados, os adultos se defendem com as
mandíbulas, tentando morder, ao mesmo tempo em que encurvam o abdome,
provavelmente também para acionar a secreção das glândulas pigidiais.
As denominações de potó-grande, potó-pimenta,
papa-pimenta, caga-fogo e caga-pimenta provavelmente
correspondem ao gênero Epicauta
(Coleoptera,
Meloidae), as cantáridas do Novo Mundo
(fig. 65), também dotadas de propriedades vesicantes (atribuídas à cantaridina)
sendo causadoras de lesões menos evidentes, que regridem em cerca de três dias.
3. Ações do veneno
A hemolinfa e a secreção glandular do potó contêm uma
potente toxina de contato, denominada pederina, de propriedades cáusticas e
vesicantes. Trata-se de uma amida cristalina, solúvel em água e no álcool, de
ação inibidora do DNA que atua em nível celular por bloqueio da mitose.
Adultos, ovos e larvas de Paederus
contêm a toxina, mas a dermatite
produzida pelas fêmeas é mais grave, sugerindo alguma relação com o sistema reprodutor
feminino.
Duas outras amidas cristalinas, a pseudopederina e a
pederona, já foram também isoladas da hemolinfa de Paederus.
4. Quadro clínico
Alguns pacientes experimentam sensação de ardor
contínuo, no momento do contato. O quadro clínico varia de
intensidade, podendo o acidente ser classificado, em:
a) Leve: discreto eritema, de início cerca de 24 horas após o
contato, que persiste por, aproximadamente, 48
horas.
b) Moderado: marcado eritema, ardor e prurido, também iniciando-se
algumas horas depois do contato. Segue-se um estádio vesicular, as lesões se
alargam gradualmente até atingirem o máximo de desenvolvimento em cerca de 48
horas. Surge, depois, um estádio escamoso: as vesículas tornam-se umbilicadas,
vão secando durante uns oito dias e esfoliam, deixando manchas pigmentadas que
persistem por um mês ou mais.
c) Grave: em geral mais extensos devido ao contato com vários
espécimes, contam com sintomas adicionais, como febre, dor local, artralgia e
vômitos. O eritema pode persistir por meses.
As lesões são tipicamente alongadas, por causa da
esfregadela do inseto sobre a pele. Daí a expressão dermatite linear. As
vesículas podem ser claras ou pustulizadas por infecção secundária. As áreas
mais expostas do corpo são as mais afetadas (fig. 66). As palmas das mãos e as
plantas dos pés parecem poupadas.
Os dedos que friccionaram o inseto podem levar a toxina
a outras áreas, inclusive à mucosa conjuntival, provocando dano ocular
(conjuntivite, blefarite, ceratite esfoliativa, irite).
O diagnóstico diferencial deve ser feito com a larva
migrans cutânea, herpes simples, dermatite herpetiforme, zoster, pênfigo,
acidente de contato com lagartas, fitofotodermatite e outras afecções.
5. Tratamento
Se o paciente esfregar inadvertidamente contra a pele
um espécime de potó, deve lavar imediatamente as áreas atingidas, com abundante
água corrente e sabão. Nas lesões instaladas, utilizar banhos anti-sépticos com
permanganato (KMnO4) 1:40.000 e antimicrobianos, como creme de Neomicina.
Alguns autores recomendam o uso de corticosteróides tópicos.
A tintura de iodo destrói a pederina e tem sido
empregada no tratamento das lesões cutâneas, mas sua aplicação pode não ser
suficientemente precoce para evitar o desenvolvimento da reação.
Antibióticos sistêmicos podem ser usados para controle
da infecção secundária.
Em caso de
contato com os olhos, deve-se lavar o local com água limpa e abundante,
instilar antibióticos para prevenir a purulência, e corticóides. A atropina
deve ser aplicada nos casos de irite.
Fonte: FUNASA
Bombeiroswaldo...