5. Principais Causas de Fome e
Desnutrição
Dentre
as principais causas da fome e da desnutrição, destacam-se as seguintes;
- produção alimentar insuficiente;
- baixa produtividade;
- desperdício;
- redução da capacidade aquisitiva de grandes
estratos populacionais, marginalizados pelo processo econômico;
- cultura alimentar deficiente e tabus
alimentares;
- problemas de comercialização;
- inexistência de uma política agrícola de longo
prazo;
- carência de incentivos ao produtor rural;
- irrigação insuficiente e mau aproveitamento
das várzeas.
a) Produção Alimentar Deficiente
Alguns
países pouco desenvolvidos e com baixas reservas cambiais em moedas fortes têm
uma produção de alimentos inferior às necessidades gerais da população.
Este
déficit de produção pode ocorrer de forma permanente ou como desastre
secundário às secas, inundações catastróficas, pragas e guerras de desgaste.
Esta situação ocorre em alguns países africanos e asiáticos.
Embora
o Brasil venha produzindo safras recordes, é forçoso reconhecer que a produção
de alimentos está muito aquém das reais potencialidades e possibilidades do
País.
Considerando
que o agronegócio é o principal nicho de excelência do Brasil no mercado
mundial, o esforço produtivo tem que ser muito intensificado.
Sem
nenhuma dúvida, uma reforma agrária conduzida com objetivos econômicos e não
paternalistas, contribuirá para intensificar o crescimento da produção.
Nas circunstâncias atuais, o Brasil,
no âmbito da economia mundial, é o:
- maior produtor e exportador de suco de
laranja;
- maior produtor e consumidor de feijão;
- segundo maior produtor e maior exportador de
frango de corte;
- maior produtor de açúcar de cana;
- maior produtor e consumidor de mandioca e
derivados;
- terceiro maior produtor de milho e de frutas;
- quarto maior produtor de hortigranjeiros;
- sexto maior produtor de grãos.
É
evidente que não existe nenhum motivo para ufanismo na constatação dos números
relativos à produção agrícola atual, considerando a grande extensão geográfica
do País e a imensa disponibilidade de recursos hídricos e de solo agricultável.
Caso haja vontade política, o Brasil se tornará o maior produtor de alimentos
do mundo, nos próximos 30 anos.
b) Baixa Produtividade
A
baixa produtividade contribui para reduzir o potencial produtivo e para
encarecer a produção.
No
Brasil, as atividades de pesquisa agrícola, objetivando o aumento da
produtividade agropecuária podem ser consideradas como vitoriosas e poderiam
estar, ainda, em melhor situação, se a EMBRAPA e os órgãos estaduais e
universitários dedicados á pesquisa agrícola fossem melhor apoiados.
O
maior estrangulamento ocorre no campo da extensão rural e foi muito agravado
pela açodada extinção da Empresa Brasileira de Extensão Rural - EMBRATER,
durante o Governo ColIor.
O
País está se mostrando muito pouco competente no alavancamento da mudança
cultural para que o pequeno produtor se aproprie dos benefícios gerados pela
tecnologia agrícola de ponta.
Já se conseguiu o domínio do ciclo
tecnológico da produção:
- de frangos e suínos de corte;
- do melhor boi tropical de corte do mundo;
- de suco de laranja;
- de soja em áreas tropicais e, até mesmo,
equatoriais;
- de óleos alimentícios de alta qualidade,
mediante a purificação, por processos físicos, do azeite de dendê.
No
entanto, na convivência diária dos inúmeros “Brasis", continua muito baixa
a produtividade leiteira e a chamada agricultura de subsistência estrita.
Para
elevar a produtividade geral do Brasil, é necessário incentivar a pesquisa
agrícola na EMBRAPA, nas empresas de pesquisa agrícola estaduais e nas
universidades com tradição de pesquisa nesta área. Mas é ainda mais urgente
incrementar as atividades de extensão rural relacionadas com a mudança
cultural. É possível que a institucionalização do Serviço Civil contribua para
alavancar extensão rural e a mudança cultural.
c) Desperdício
No
Brasil, o desperdício é estrutural e está relacionado com o deficiente controle
de qualidade e com numerosos problemas referentes à colheita e à pós-colheita,
compreendendo o armazenamento, a frigorificação, a embalagem, a circulação
preferencial e a deficiente comercialização de alimentos.
O
desperdício estrutural é maior nos países em desenvolvimento que nos países
desenvolvidos.
No Brasil, em termos médios, o
desperdício estrutural corresponde a aproximadamente:
- 25% da produção de grãos;
- 30% da produção de frutas frescas;
- 35% da produção de hortigranjeiros.
Há
muito o que trabalhar para reduzir o desperdício estrutural do Brasil.
Em
outros países, o desperdício é "cultural" e está relacionado com uma
posição pouco altruísta, no que se refere à fartura. Nesses países, é habitual
que os pratos sejam servidos com muito mais alimentos do que os passíveis de
serem consumidos por pessoas normais.
Este
costume, além de gerar uma população de obesos hipernutridos, aumenta
desnecessariamente o lixo orgânico. Calcula-se que, nos Estados Unidos, o
alimento diariamente jogado no lixo daria para sustentar uma população de 80
milhões de famintos.
d) Redução da Capacidade Aquisitiva de
Grandes Estratos Populacionais
Marginalizados pelo Processo Econômico
Grandes
contingentes populacionais alimentam-se inadequadamente, por não terem capacidade
financeira para adquirirem os alimentos de que necessitam.
O
nordestino que padece de fome na seca não tem fome, em conseqüência do
desabastecimento, mas sim porque não tem dinheiro para comprar alimentos. O
problema real é a deficiência de empregos remunerados, como conseqüência do
estancamento da economia.
Os grandes vilões responsáveis pelas
carências alimentares, existentes no Brasil, são:
- a concentração de renda;
- os desequilíbrios inter-regionais,
intra-regionais e sociais;
- o desemprego;
- a pobreza;
- a especulação;
- o êxodo rural;
- os bolsões de pobreza na periferia dos centros
urbanos.
O
problema real não é de subprodução, mas de subconsumo.
e) Cultura Alimentar e Tabus
Alimentares
Grandes
contingentes populacionais alimentam-se inadequadamente, em função de uma
cultura alimentar deficiente, geradora de numerosos tabus alimentares.
Já
se constatou que, quanto mais baixo for o nível socioeconômico e cultural de
uma população, mais reduzido será o seu leque de opções alimentares e maiores
os tabus relacionados com a alimentação.
O
problema da baixa cultura alimentar e da desinformação gera grandes paradoxos.
É
comum que alguns contingentes populacionais joguem no lixo a porção mais
nutritiva de alguns alimentos hortigranjeiros e usem como alimento a porção de
menor valor nutritivo.
Os
tabus alimentares relacionados com o chamado “resguardo" das mulheres,
enquanto grávidas ou nutrizes, geram grandes malefícios. Como nestas fases o
organismo materno está formando o organismo do feto e, depois, transmitindo
princípios alimentares para o lactente, os tabus nutritivos acabam por espoliar
o organismo feminino. É importante registrar
que
a grande maioria dos tabus de resguardo foram transmitidos à sociedade
brasileira por nossos ancestrais indígenas. Também os tabus, antigos e
modernos, relacionados com a alimentação infantil são extremamente
prejudiciais.
Os
tabus relacionados com horários de alimentação e com combinações de alimentos
incompatíveis foram, em sua grande maioria, incorporados na sociedade
brasileira durante a época da escravidão, para restringir o consumo de
alimentos pela população escrava.
A
utilização de profissionais de economia doméstica, nas atividades de extensão,
é de vital importância para reduzir esta vulnerabilidade sociocultural.
f) Problemas de Comercialização
O grande número de agentes econômicos
intermediários, escalonados ao longo da cadeia de comercialização da produção
agrícola, quando associada à reduzida capacidade econômica do pequeno produtor
e do pequeno comércio varejista, provoca um ciclo de comercialização
extremamente perverso:
- o produtor é mau remunerado;
- o consumidor paga preços extremamente
elevados;
- o comércio atacadista, antiquado e pouco
competitivo busca prosperar, em função da luta sem quartel “contra a
modernização”.
É
necessário que se fortaleça o poder do produtor e do consumidor e que se
obrigue o comércio atacadista a se modernizar e a aumentar sua competitividade.
O
poder do consumidor está aumentando com a estabilização da economia, o controle
da inflação e com a valorização da moeda. No entanto, é necessário que o
próprio consumidor se conscientize de seu poder e rompa definitivamente com a
cultura inflacionária.
A
garantia de preços ao produtor pode ser facilitada pelo associativismo e pela
vinculação dos empréstimos bancários ao valor do produto agrícola,
transformando o sistema bancário no principal interessado em manter uma boa
remuneração para a produção.
Quando a moeda é forte e estável,
desaparece:
- a necessidade de formar grandes estoques
imobilizados;
- a urgência em adquirir bens de consumo.
Na
medida em que a cultura de inflação for ultrapassada, caberá ao comércio o ônus
de aquecer o mercado, reduzindo sua margem de lucro.
O
incremento das cooperativas de produção e de consumo e das grandes centrais de
aquisição centralizada pelas grandes cadeias de comercialização, juntamente com
as centrais de vendas vinculadas aos produtores, forçam o comércio atacadista a
se modernizar para se adaptar à intensificação da concorrência.
g) Inexistência de uma Política
Agrícola de Longo Prazo
A Política Agrícola Brasileira deve
fundamentar-se no diagnóstico da realidade do País. É óbvio que:
- o agronegócio é responsável por quase 60% do
Produto Nacional Bruto;
- o Brasil é um país essencialmente agrícola;
- o setor agrícola garante os principais nichos
de excelência do Brasil, no mercado global;
- o agronegócio é o maior empregador da economia
brasileira;
- importantes contingentes da população
brasileira ainda sofrem de carências alimentares, apesar de todas as condições
que favorecem o incremento do agronegócio.
A
Política Agrícola do Brasil deve ser consentânea com esta realidade. É
absolutamente necessário que o clima de incertezas e de inseguranças,
relacionado como setor, seja substituído por uma política de longo prazo
coerente com as reais vocações deste imenso País.
A
seguir, são apresentadas algumas diretrizes gerais que devem nortear a Política
Agrícola do Brasil.
O
produtor rural deve ser incentivado a aumentar sua produtividade e a
diversificar sua produção. O aumento da produtividade gera um maior volume de
produtos comercializáveis e aumenta a renda do produtor rural.
A diversificação
da produção agropecuária reduz a margem de riscos, relacionada com problemas
conjunturais, nas áreas de produção e de comercialização, por ocasião das
safras, e contribui para garantir pleno emprego da mão-deobra, durante todo o
ano agrícola.
A
reforma agrária é indispensável e urgente. Em princípio, o produtor rural mais
competente deve ser o proprietário da terra. A reforma agrária deve ser vista
como um mecanismo de incremento da produção e de alavancamento econômico do
setor e, em nenhuma hipótese, como um instrumento de benesse social e muito
menos, com o objetivo de promover a agricultura de subsistência estrita.
A
agricultura de subsistência estrita deve evoluir para uma agricultura altamente
tecnificada e produtiva que permita a geração de grandes excedentes
comercializáveis pelo pequeno produtor, facilitando sua emergência social e sua
auto-afirmação como agente econômico.
O
processo deve ser direcionado para garantir o desenvolvimento de uma
agricultura altamente tecnificada e muito competitiva, em função de seus altos
níveis de produtividade. Devem ser geradas condições para que a agricultura
brasileira aumente a sua capacidade de ocupar nichos de excelência no mercado
global, cada vez maiores e mais importantes.
Os
subprogramas de redução do desperdício e de perdas na colheita e na póscolheita
devem ser priorizados, principalmente os relacionados com o controle de
qualidade e beneficiamento dos produtos, com o armazenamento e a frigorificação
dos produtos e com o acondicionamento em embalagens seguras e com a circulação,
a industrialização e a comercialização preferencial das safras agrícolas.
O
controle de qualidade e do nível de sanidade e de salubridade dos produtos
agropecuários deve ser compatibilizado com os elevados padrões de exigência dos
mercados de maior poder aquisitivo. Todas as oportunidades de aumentar o nível
de participação da agropecuária brasileira no mercado global devem ser
aproveitadas.
Os
projetos de interiorização da agroindústria e das indústrias de produção de
equipamentos e de insumos agrícolas devem ser incentivados, com grande
prioridade, com o objetivo de fortalecer os pólos terciários e secundários de
desenvolvimento e fixar a mão-de-obra na interface entre o meio urbano e rural.
É
muito importante que a multipolarização da economia seja incrementada, com o
objetivo de otimizar a distribuição da renda, aquecer o mercado consumidor e,
em conseqüência, incrementar a produção e a comercialização dos produtos
agropecuários.
h) Carência de Incentivos ao Produtor
Rural
Todos
os países desenvolvidos da América do Norte, da Europa Ocidental e do Extremo
Oriente (Japão) incentivam e protegem seus produtores rurais e suas indústrias
artesanais.
Em
todos esses países, a agricultura, a pesca oceânica e a produção pecuária são
consideradas como de importância estratégica, embora a sua participação na
formação do Produto Interno Bruto seja pouco importante.
O país mais
desenvolvido do mundo é também a maior potência agrícola do globo terrestre e
incentiva decisivamente seus produtores agrícolas, protegendo-os tenazmente
contra a concorrência externa.
No
Brasil, não pode ser diferente. Ao contrário, como os principais nichos de
excelência do Brasil, no contexto do mercado global, relacionam-se com o
agronegócio, é lógico que este setor deverá ser incentivado com o máximo de
prioridade.
É
evidente que, no caso do Brasil, não é necessário que o Estado assuma parte do
custo da produção, como acontece na grande maioria dos países mais
desenvolvidos.
Aqui os incentivos devem
centralizar-se:
- na redução do chamado “custo-brasil", que
depende da solução de problemas de infra-estrutura;
- na pesquisa agrícola, na extensão rural e na
mudança cultural do setor agropecuário.
i) Suficiente Irrigação e
Aproveitamento das Várzeas
O
Brasil tem mais de 25% das reservas hídricas de superfície, em estado liquido,
do globo terrestre.
O
País possui também extensas bacias sedimentares, com um potencial de águas de
subsuperfície extremamente importante, o qual vem sendo subaproveitado,
especialmente no que diz respeito ao aproveitamento destas águas no Nordeste
semi-árido.
Nenhum
país do mundo tem áreas de várzeas inundáveis tão extensas quanto o Brasil.
Dos
mais de 570 milhões de hectares de terra que constituem a Amazônia brasileira,
aproximadamente 10%, ou seja, 56 milhões de hectares são constituídos por
várzeas, fertilizadas naturalmente pelas inundações cíclicas anuais.
As
várzeas da Amazônia brasileira, atualmente subaproveitadas, correspondem a mais
de 80 (oitenta) vales do Nilo.
O
aproveitamento racional e adequado deste imenso potencial hídrico, associado ao
elevadíssimo nível de fotoperiodismo, que é uma das principais características
deste pais tropical de dimensões continentais, fatalmente transformará o Brasil
na maior potência agrícola do globo terrestre, durante o Terceiro Milênio.
É
absolutamente inaceitável que ainda exista fome num país com as potencialidades
do Brasil.
Ao
contrário, basta que haja vontade e determinação política para que o Brasil se
transforme no maior celeiro do mundo.
No
entanto, o aproveitamento das várzeas e os projetos de irrigação devem ser
conduzidos com tecnologia adequada, para que se evite a degradação do solo e a
contaminação das águas de superfície e subsuperfície.
Na época de - ashington Luis, foi
forjado um mote político:
"Governar
é abrir estradas”.
Nos dias atuais, o principal mote
político deveria ser:
"Governar
é aproveitar adequadamente o imenso potencial hídrico do Brasil.”
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