XII
Lisa melhorava pouco a pouco; já dava pequenos
passeios mas inquietava-se com a mudança do marido, cuja causa ela não
compreendia. Bárbara Alexievna retirou-se por algum tempo e em casa apenas
ficaram o tio e Maria Pavlovna. Eugénio encontrava-se nesse estado de angústia,
quando chegaram as grandes chuvas que se prolongam por alguns dias, como sucede
sempre depois das tempestades de Junho. As chuvas fizeram suspender todos os
trabalhos: não se podia juntar o estrume por causa da humidade e da lama e os
camponeses esperavam em casa; os pastores dificilmente conseguiam meter os
rebanhos nos redis, as vacas e os carneiros invadiam os pátios, e as mulheres
descalças e de xale, patinhando na lama, procuravam os animais tresmalhados. Os
caminhos estavam transformados em ribeiros, as folhas e a erva estavam
ensopados, os riachos e as lagoas transbordavam. Eugénio ficara em casa com a
mulher, que começara a sentir-se um pouco agoniada. Lisa várias vezes
interrogara o marido sobre a causa daquela mudança de disposição, mas ele
respondia-lhe com enfado dizendo que não tinha nada. Lisa desistira por fim de
o interrogar e ficara triste.
Uma tarde, depois do almoço, estavam todos reunidos no
salão e pela milésima vez o tio contava as suas aventuras mundanas. Lisa
trabalhava num casaquinho de bebé e suspirava, queixando-se do mau tempo e de
dores nos rins. O tio pediu vinho e aconselhou-a a que se deitasse. Eugénio
aborrecia-se muito em casa; tudo ali lhe era desagradável. Fumava e lia, mas
sem compreender o que lia. «Tenho que sair para ver o que se passa», disse, e
levantou-se para sair.
- Leva o guarda-chuva.
- Não, tenho o casaco de couro, e não vou ao bosque.
Calçou as botas, vestiu o casaco de couro e foi até à
refinaria. Mas ainda não tinha dado vinte passos quando encontrou Stepanida com
a saia arregaçada até ao joelho, mostrando a perna branca. Caminhava segurando,
com as mãos o xale que lhe cobria a cabeça e os ombros.
- Que procuras? - perguntou sem saber com quem falava.
Quando a reconheceu já era tarde. Ela parou, sorriu,
fitou-o demoradamente.
- Procuro um bezerrinho. Onde vai o senhor com este
tempo? - perguntou como se se vissem todos os dias.
- Vamos à cabana - disse Eugénio sem mesmo dar pelas
palavras que pronunciara.
Ela fez, com os olhos, um sinal de assentimento e
dirigiu-se para o jardim direita à cabana; ele seguiu o seu caminho com
intenção de contornar o massiço de lilazes e ir juntar-se-lhe.
- Senhor! - gritaram-lhe atrás - a senhora pede-lhe
que vá a casa depressa.
Era o criado Miguel. Meu Deus! salvaste-me pela
segunda vez!, pensou Eugénio; e voltou logo para casa. Lisa queria lembrar-lhe
que ele prometera uma poção a certa doente e
pedia-lhe que não se esqueceria de a arranjar.
Decorreram quinze minutos enquanto preparava a poção
e, quando saiu, não se atreveu a ir directamente à cabana receando que alguém o
visse. Mal percebeu que o não viam, deu uma volta e dirigiu-se para a cabana.
Sonhava vê-la ali sorrindo alegremente, mas não a encontrou, e não havia
indício de lá ter estado. Pensou que não tivesse ido, que não compreendesse ou
não ouvisse as suas palavras murmuradas entre dentes, ou que talvez não o
quisesse. «E porque razão havia de lançar-se-me ao pescoço?» interrogara. «Tem
o marido. Eu é que sou um miserável; tenho uma linda mulher e ando atrás de
outra».
Sentado na cabana onde a água escorria a um canto,
Eugénio pensava. Que felicidade se ela tivesse vindo! Sozinhos ali, com aquela
chuva! Possuí-la ao menos uma vez, quaisquer que fossem as consequências! «Ah,
sim - lembrou-se - se ela veio deve ter deixado rasto». Olhou para o chão, para
um carreirinho sem relva e notou as pegadas de um pé descalço.
Sim, ela tinha vindo. Já não hesitaria. Onde quer que
a visse, iria ter com ela. Iria a sua casa, de noite. Esteve muito tempo na
cabana acabando por se afastar ansioso e cansado.
Levou a poção, regressou a casa e deitou-se à espera
da hora do jantar.
Barros Vital
Nenhum comentário:
Postar um comentário