VENDA DE SEGURANÇA E MATADORES A SOLDO
CODAR
– HS.CVS/CODAR – 22.213
1. Caracterização
A
organização dos chamados “esquadrões da morte”, a proliferação de justiceiros e
de matadores a soldo, a venda de segurança e de proteção e o ressurgimento do
coronelismo, caracterizado pelo apadrinhamento e proteção de matadores, são
sintomas de grave enfermidade social.
Este
fenômeno traduz a falência das instituições regulares, responsáveis pela
garantia da segurança pública, associa-se a um quadro social de desvalorização
da vida e demonstra um profundo descrédito, relacionado com a funcionalidade e
com a eficácia do poder judiciário.
É
sabido que, em muitos casos, o rito processual muito lento, o acúmulo de trabalho
e as excessivas preocupações com a garantia dos direitos civis dos delinqüentes
acabam retardando a ação da justiça.
Como
os tribunais julgam em função das provas inseridas nos processos, inquéritos
policiais mal conduzidos e crivados de erros facilitam a ação obstrutiva dos
advogados de defesa dos réus, e contribuem para reduzir as possibilidades de
apenação dos mesmos, por parte dos tribunais.
O
descrédito na Polícia e na eficácia do Poder Judiciário pode levar muitas
pessoas a apoiarem um ”poder paralelo”, representado por organizações
clandestinas de matadores, que passam a acumular, de forma absolutamente ilegal
e antiética, as funções de polícia e de justiça.
Os
menores delinqüentes costumam ser as maiores vítimas destas organizações
clandestinas.
2. Discussão sobre as Deformações
Psicológicas dos Matadores a Soldo
Se
a Terra fosse reduzida a uma esfera com um metro de diâmetro, elevações, como
as montanhas do Himalaia, seriam representadas com menos de um milímetro de
altura.
O
verniz ético e moral, desenvolvido em pouco menos de 2 milênios de evolução
social e cultural da “besta humana, que vêm sobrevivendo a prováveis 5 (cinco)
milhões de anos sobre a superfície da terra, é provavelmente menos espesso que
o relevo representado no modelado hipotético.
Um
animal carnívoro domesticado, que ao longo de toda a sua vida só recebeu rações
pré-fabricadas, após provar o sangue de uma presa acidentalmente abatida por
ele, e sentir a euforia do “poder de matar”, restabelece imediatamente seus
arcanos mentais de animal predador, aparentemente sepultado nos recônditos de
seu cérebro.
Da
mesma forma, toda a hiperagressividade latente, que caracteriza o animal
predador existente na “besta humana” retorna de forma avassaladora, nos
matadores a soldo.
Só
que, diferente dos demais animais predadores, o matador degenerado passa a
sentir prazer ao predar sua própria espécie.
Em
muito pouco tempo, a deformação mental que ocorre nestes indivíduos,
essencialmente maus, transforma o ritual de eliminação de seres humanos numa
fonte de prazer e numa forma absolutamente degenerada e absurda de expressar o
seu poder.
Existem dois padrões definidos de
matadores a soldo:
- Os “tocaieiros” profissionais, que estudam os
hábitos da presa, e agem solitariamente em “tocaias ou “esperas” armadas para
caçá-las de surpresa.
- Os matadores de esquadrões que se reúnem em
bandos e executam suas presas, avisando-as sobre sua morte eminente e
descarregando simultaneamente as armas sobre as vítimas.
Neste
último caso, prevalece o instinto gregário, típico dos canídeos e as culpas são
divididas pelo grupo, na incerteza do projétil mortal que acabou com a vida da
vítima.
3. Ocorrência
A
venda de segurança e os matadores a soldo ocorrem em praticamente todos os
países do mundo.
Nos
países mais desenvolvidos, o fenômeno ocorre com maior freqüência nas áreas de
“guetos sociais ou raciais”, onde as quadrilhas se organizam para “vender
segurança” aos pequenos comerciantes. Em muitos casos, parte dos pequenos
comerciantes tem a iniciativa de contratar seguranças e justiceiros, para
dizimarem as gangues de assaltantes, que se habituam a depredar seus negócios.
Em
qualquer país do mundo, mesmo nos mais desenvolvidos, é possível se contratar
um matador profissional e encomendar a eliminação de um desafeto.
Na
realidade, ninguém está absolutamente seguro e qualquer pessoa pode ser
eliminada por um matador profissional. O culto da fraternidade e da bondade
ainda é muito recente e pouco arraigado na humanidade e a insegurança é uma
realidade sociocultural, no início deste terceiro milênio da vinda de Jesus
Cristo.
No
Brasil, esta doença social está profundamente arraigada na sociedade
brasileira, desde os primórdios da colonização, associada ao poder ilimitado
dos “Donatários das Capitanias Hereditárias” e dos donos das grandes
“Sesmarias”, que assumiram poderes de “vida e de morte” sobre todos os seus
“dependentes”.
No
Nordeste, o Coronelismo, no Sul o Caudilhismo, são fenômenos relacionados com o
problema e os “coronéis“ e os “caudilhos” atuavam como senhores de exércitos
particulares, protegendo e apadrinhando matadores, que atuavam sobre suas
ordens. O cangaço e as inúmeras revoltas que pontilharam a História deste país
caracterizam a reação desorganizada, contra os excessos do poder local.
O
fenômeno vem recrudescendo, nos tempos atuais, especialmente nos bolsões
periféricos de pobreza das grandes megalópoles, como uma reação à proliferação
de “gangues de assaltantes”.
Em
alguns estados e cidades do Brasil, é muito fácil comprovar que estes
“esquadrões de justiceiros” estão interrelacionados com policiais, descontentes
com a dinâmica social e com o “retardo da justiça”. Está comprovado que os
menores de rua e os delinqüentes jovens são as maiores vítimas destes
esquadrões de matadores.
4. Principais Efeitos Adversos
Os
danos causados pelos “esquadrões de justiceiros” às comunidades “protegidas”
são tão grandes ou maiores que os causados pelas quadrilhas de bandidos.
Nestas
condições, as pessoas que financiam ou comandam os “esquadrões de justiceiros”
assumem poderes de vida e de morte sobre todos os membros da comunidade e não
apenas sobre possíveis delinqüentes.
Cresce
o clima de prepotência e a população inerme e submetida à “lei do silêncio” e a
um estado de cumplicidade com os matadores, semelhante ao existente nos campos
de concentração nazistas, dedicados ao extermínio de judeus.
Nestes
casos, o ritual que define aqueles que devem morrer funciona como um imenso
jogo de azar, que rompe a coesão social da comunidade agredida, para a qual a
sobrevivência passa a depender da capacidade de adaptação às “regras do jogo”,
que são altamente cambiantes.
Com
o tempo, o instinto de sobrevivência e o egoísmo promovem uma estranha
cumplicidade entre as vítimas sobreviventes e seus algozes.
Os
danos psicológicos e sociais gerados pela convivência diária entre uma
população de presas potenciais, com seus predadores, são extremamente graves e
difíceis de serem sanados e o direito à vida começa a perder sua prioridade.
5. Monitorização, Alerta e Alarme
É
importante que o sistema de monitorização social detecte rapidamente o fenômeno
e estude as vulnerabilidades do aparelho social local, que estão contribuindo
para exacerbá-lo.
A
infiltração de policiais nestas organizações clandestinas só pode ser detectada
e combatida por uma atividade constante de auditoria, que busque identificar
rapidamente as áreas policiais mais prepotentes e propensas a aderir a estas
organizações clandestinas.
6. Medidas Preventivas
O
vácuo de poder é o ponto focal do fenômeno, que promove o surgimento de
organizações paralelas de justiceiros e de vendedores de segurança.
Muitas
vezes, o incremento do fenômeno relaciona-se com o funcionamento desarmônico e
não interativo entre as forças policiais e o “Poder Judiciário”.
Esta
situação pré-caótica e desarranjadora é a causa do surgimento de um “poder
paralelo”, que se propõe a acumular as funções de polícia e de justiça.
Para solucionar cabalmente o problema
é necessário:
- Assegurar a presença do Estado e reduzir os
vácuos de poder, em toda a extensão geográfica do país.
- Incrementar o poder de polícia, elevar
substancialmente a qualidade de seus recursos humanos e incrementar as
atividades de auditoria interna, no sentido de reduzir possíveis focos de corrupção.
- Incrementar as atividades de “polícia
comunitária”, com o objetivo de obter uma sadia interação entre a polícia e as
lideranças comunitárias positivas.
- Fortalecer, incrementar e modernizar o Poder
Judiciário.
- Fortalecer e modernizar a atuação dos
“Promotores de Justiça”.
- Desenvolver um forte programa de mudança
cultural, com o objetivo de “valorizar a vida humana”.
É
muito importante que uma elite de jovens advogados, que concluem nossas
universidades, seja atraída para o processo de seleção e de pós-graduação de
“promotores públicos”.
É
saudável que os promotores sejam designados para os casos, ainda nas fases de
“inquérito policial”, com o objetivo de sanar as freqüentes falhas que ocorrem
nesta fase. É desejável que os promotores de justiça, da mesma forma que os
delegados de polícia, sejam submetidos a cursos de pós-graduação e a freqüentes
reciclagens de conhecimentos, com o objetivo de otimizar os conhecimentos e de
incrementar as virtudes relacionadas com o idealismo, buscando promover grupos
profissionais de escol e absolutamente imunes à corrupção e a falsos conceitos
corporativistas.
Certamente,
o idealismo e o espírito de coesão destes grupos de escol concorrerão para a
modernização e para a moralização dos quadros da promotoria e da polícia
judiciária e para facilitar o desenvolvimento de ações coordenadas e
interativas entre a polícia judiciária e o Poder Judiciário.
Para
que os jovens advogados mais promissores sejam atraídos para o Ministério
Público e para a Polícia Judiciária é necessário que o nível de remuneração
seja compatível com os objetivos colimados.
A máquina responsável pelo
funcionamento do poder paralelo deve ser desmontada:
- Todos os policiais suspeitos de envolvimento
com matadores a soldo devem ser investigados, afastados sumariamente e
submetidos a inquéritos rigorosos.
- Os financiadores das organizações paralelas de
“justiceiros a soldo” devem ser identificados, investigados e punidos.
Uma
estrutura policial local, inteiramente renovada e não relacionada com a
estrutura anterior, deve intervir no processo, devidamente apoiada pelo
Ministério Público.
O
espírito comunitário deve ser fortalecido. A dívida social contraída em séculos
de desenvolvimento histórico deve ser reduzida.
Programas de mudança cultural,
com o objetivo de valorizar a vida, promover a saúde e incrementar a cidadania,
devem ser desencadeados, com o apoio do Sistema Nacional de Defesa Civil.
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