Abertura e entrada em incêndio
“A abertura
mais importante de um incêndio é aquela por onde devem entrar os bombeiros”.
Abrir uma porta para a entrada é um momento crítico no qual os
bombeiros se expõem às condições internas do cômodo incendiado.
Por isso, toda e qualquer abertura (interna ou externa)
demanda cuidados para evitar risco à vida dos bombeiros e de eventuais vítimas.
Além de cessar a proteção oferecida pelo isolamento dos ambientes,
a abertura do cômodo do foco aumenta a velocidade da combustão por injetar ar
no ambiente.
Para entrar na edificação sinistrada, é necessário:
• avaliar o incêndio e a edificação;
• escolher a(s) abertura(s) a ser (em) feita(s);
• fazer a abertura dentro da técnica adotada;
• entrar na edificação pela abertura escolhida.
Avaliação do incêndio e da edificação
Antes de iniciar qualquer ação em um ambiente sinistrado,
deve-se,primeiramente, fazer o reconhecimento e a avaliação das condições do
local. Incêndios em edificações tendem a acumular fumaça em seu interior. Se a
abordagem for feita de forma errada, o risco de os bombeiros serem
surpreendidos por um comportamento extremo do fogo é grande e deve ser evitado.
Figura 153 - Incêndio no prédio do INSS, em Brasilia-DF —
2005
A avaliação para abertura e entrada deve levar em
consideração:
- a existência de vítimas e sua possível localização;
- as condições
de segurança do local;
- as características da edificação (tipo de material construtivo,
o número de pavimentos, tipo de teto e tipo de piso, etc.);
- a localização das saídas alternativas (janelas, etc.), dos
obstáculos existentes (grades, cadeados, etc.) e as características do incêndio
(sinais indicativos de fenômenos extremos do fogo, a provável localização do
foco, etc.).
Estas informações são importantes para facilitar as ações de
resgate, de progressão e combate ao fogo, a orientação no interior da
edificação e a localização de rota de fuga alternativa, se necessário.
O fenômeno do flashover não ocorre enquanto o cômodo
atingido pelo incêndio estiver fechado e sem qualquer abertura que permita a entrada
de ar.
Como regra geral, na avaliação do sinistro, os bombeiros a deparar-se com portas deverão fechá-las, quando se tratar de
ambientes preservados, com ou sem vítimas. Entretanto nos ambientes incendiados,
o procedimento varia: se houver vítimas, a porta deverá permanecer aberta.
Se não houver vítimas e a porta estiver inicialmente aberta,
não deverá ser fechada; e com a porta inicialmente fechada, a dupla de bombeiros
deverá fechá-la, após entrar com os procedimentos corretos de abertura de
porta. Evita-se fechar totalmente a porta para não travá-la.
A porta deve permanecer aberta se houver ocupantes saindo da
edificação.
Escolhendo a entrada
Sempre que possível, a porta para entrada de bombeiros deve
ser escolhida na área não atingida pelas chamas e entre o foco do incêndio e as
vítimas. Essa entrada proporcionará aos bombeiros uma posição adequada para a
proteção de vítimas, da área ainda não atingida e para o ataque ao fogo de
dentro para fora da edificação.
Figura 154 - A melhor entrada para os bombeiros é entre as vítimas e o foco
Se estiver sendo utilizada ventilação forçada por ventiladores, a entrada dos bombeiros dar-se-á, obrigatoriamente, pela entrada de ar feita para o ventilador, o que garantirá uma temperatura mais amena e maior visibilidade no ambiente.
Figura 155 - Entrada com uso de ventilação forçada
Fazendo a abertura de porta
A zona próxima da porta a ser aberta é uma área de risco,
por isso, deve ser evitada a presença de pessoas que não estejam envolvidas
diretamente nesta ação, por ser esta a saída natural da fumaça liberada. Outras
áreas de risco, que devem ser evitadas durante o procedimento de abertura, são
as escadas não protegidas e os pavimentos superiores, devido ao risco de
ignição de fumaça nestes ambientes.
Posicionar as linhas de ataque e de segurança
• Preparar linhas de mangueiras –
Realizar a armação de linhas deixando um seio de mangueira suficiente para
chegar ao foco do incêndio. As mangueiras devem estar devidamente pressurizadas
para o ataque e para a segurança ou apoio.
• Posicionar a guarnição – O chefe e o
ajudante, totalmente equipados, se posicionam de joelhos, cada um de um lado da porta.
Se a porta abrir para dentro o chefe se posicionará do lado da dobradiça. Se
abrir para fora, ele se posicionará do lado da maçaneta. A linha de apoio se
posicionará, também de joelhos, sempre atrás do ajudante da linha de ataque,
enquanto o chefe da guarnição, também protegido pela parede e de joelhos, se posicionará
próximo ao chefe da linha de ataque.
• Regular o esguicho – O chefe porta o
esguicho, já regulado para vazão de 30 GPM e jato compacto e o ajudante inicia
a identificação dos sinais que indiquem risco de backdraft.
Identificar na
porta sinais que indiquem risco de backdraft
• Fumaça saindo sob pressão pelas frestas
e ruídos de aspiração de ar – Deve-se observar em torno da porta para
identificar se está saindo fumaça sob pressão e tentar ouvir ruídos de
aspiração de ar para dentro do local. O risco é maior se a fumaça estiver
saindo por baixo da porta, pois indica que todo o ambiente está tomado por ela.
Neste caso o ideal é realizar uma ventilação vertical antes da abertura.
Em algumas situações, a chuva, a existência de laje, redes elétricas ou outros fatores podem tornar a abertura no
telhado muito difícil, perigosa ou demorada. Dessa forma, a abertura deve ser
feita no ponto mais alto possível do ambiente (fig. 156).
Entretanto, se não houver uma abertura alta o suficiente
para evitar um backdraft, será necessário realizar a técnica de abertura e
entrada pela porta.
Figura 156 – Exemplos de procedimentos de abertura
• Alterações na pintura da porta – A pintura da porta danifica-se facilmente pela ação do calor, pois ela muda a coloração e começa a se deformar. Outra forma de identificar esta alteração na porta é tateá-la com a mão, usando luvas adequadas, para detectar outras deformidades como tinta amolecida, grudando e esfacelando com ao toque da mão.
• Aquecimento da porta – O aquecimento da porta é outro fator que pode ser diagnosticado pelo toque da mão. Normalmente a parte inferior da porta estará menos aquecida que a parte superior, por isso, deve-se realizar esta verificação iniciando da extremidade inferior da porta. Recomenda-se utilizar luvas de combate a incêndio e realizar o toque pouco a pouco, primeiro com as extremidades dos dedos e somente depois com os dedos e a palma da mão para diminuir, ao máximo, o risco de queimadura.
• Ausência dos sinais de fenômenos extremos na porta – É importante ressaltar que deve-se observar outros sinais de fenômenos extremos, pois pode ocorrer a ausência destes na porta se a mesma for confeccionada com materiais resistentes e retardantes contra fogo, ou seja, ausência de sinais na porta não significa ausência de fenômenos extremos.
OBSERVAÇÃO: Na verificação dos sinais e nos procedimentos a seguir, é importante uma boa comunicação entre toda a equipe (linha de ataque, linha de apoio e chefe de guarnição). Cada sinal observado deve ser comunicado ao outro e a abertura deve ser divulgada e coordenada.
Figura 157 - Observando sinais de saída de fumaça e ruídos de aspiração de ar
Figura 158 - Verificando aquecimento da porta e alterações na pintura
Preparar para abertura e entrada
Figura 159 - Molhando a porta de baixo para cima
• Verificar se a porta não está trancada - Se estiver, fazer o arrombamento utilizando o material adequado. Não é aconselhável arrombar a porta abruptamente, por dois motivos: alguma vítima pode encontrar-se desmaiada atrás desta; e pode ocorrer a entrada indesejada de ar no ambiente, devido à abertura sem controle.
• Controlar a abertura - Para arrombar a porta e controlar a sua abertura abrupta, pode-se amarrá-la pelo trinco com uma corda ou cordelete. Isso é particularmente importante nas portas que abrem para dentro, que são as mais comuns. Desse modo a porta fica destrancada e pronta para ser aberta. Durante o procedimento de arrombamento a porta deve ser mantida resfriada.
• Modificar a regulagem do jato – Regular o jato para 35° de amplitude, permanecendo com a mesma vazão de 30 GPM.
• Aplicar jatos atomizados acima da porta – Ainda com a porta fechada, o chefe da linha de ataque deve aplicar dois jatos, de menos de um segundo cada, acima da porta, o primeiro do seu lado, praticamente acima de sua cabeça, e o segundo do lado do ajudante. Esse procedimento é capaz de resfriar a fumaça acumulada, que irá sair com a abertura da porta. A fumaça quente será liberada num local úmido, dentro de uma “nuvem”, dificultando a ocorrência de backdraft ou ignição de fumaça.
Figura 160 - Aplicando pulso acima da porta
Abrir a porta, aplicar jatos no interior e fechar a porta Imediatamente após o segundo jato acima da porta, o ajudante faz uma pequena abertura na porta, o suficiente para a passagem do jato de água, enquanto o chefe da linha aplica um pulso, de 2 segundos, dentro do ambiente.
Quando o chefe finalizar o jato, o ajudante fecha a porta imediatamente.
Figura 161 - Aplicando jato no interior e fechando a porta
Definir por continuar a estabilização ou pelo inicio da progressão
• Observar as condições do incêndio – Nesta primeira abertura deve-se observar se existem chamas visíveis, acúmulo de fumaça, se há sinais visuais ou audíveis de que possa haver vítimas, sinais de colapso de estruturas ou quedas de forros. As condições observadas devem ser comunicadas ao comandante de socorro.
• Repetir a técnica se o ambiente ainda não oferecer segurança – Se a água lançada no ambiente evaporar, se durante a abertura e a aplicação do jato for observada saída de fumaça quente ou chamas na parte superior ou ainda aspiração violenta em baixo, o ambiente estará a uma temperatura muito alta.
Neste caso, é necessário repetir a técnica de abertura por mais duas vezes ou até a estabilização do ambiente, possibilitando a entrada e a progressão dos bombeiros. Ou seja, aplicar jatos acima da porta, abri-la, aplicar 1 pulso de jato atomizado no interior e fechar a porta, aguardando, entre uma abertura e outra, um tempo de 5 e 8 segundos.4
• Realizar a entrada se o ambiente oferecer segurança – Se a água lançada cai ou atinge o teto, então a temperatura é moderada.
Portanto, não será necessário estabilizar a fumaça, e a aplicação da água será restrita ao foco. Neste caso, procede-se a entrada no ambiente.
Entrada
• A dupla de ataque realiza a entrada – O ajudante se posiciona na mangueira do lado oposto ao chefe e fecha a porta, enquanto o chefe aplica, se necessário, dois pulsos de um segundo cada e depois regula o esguicho para 60° de amplitude do jato. A dupla realiza a progressão adequada, até o local do foco.
Figura 162 – Momento da entrada no ambiente
• Portas e janelas devem permanecer fechadas – Enquanto não for estabelecida uma forma eficiente para o escoamento da fumaça, as portas e janelas devem permanecer fechadas, inclusive quando os bombeiros estiverem no interior efetuando a progressão em direção ao foco de incêndio, assim evita-se uma possível ignição da fumaça provocada pela entrada de ar vinda por trás deles.
• Entrar somente o pessoal necessário – Apenas o pessoal necessário para o combate deve entrar no ambiente, totalmente protegido por EPI/EPR (exceto quando da utilização da técnica de proteção de rota de fuga). A entrada de várias pessoas dificulta a saída em caso de perigo e expõe a guarnição desnecessariamente. Outro bombeiro, o qual pode ser o próprio chefe da guarnição de combate a incêndio, permanece à porta, controlando o avanço ou recuo da mangueira. Esse combatente também estará protegido por EPI/EPR.
• Teste de teto – Já dentro do ambiente é útil fazer o teste do teto, que consiste em lançar para o alto um pulso de jato atomizado, observando se a água cai ou evapora. Se as partículas de água caem é sinal de que o local não está superaquecido e pode-se continuar a progressão. A evaporação da água indica que o local está com gases superaquecidos e a situação é de risco. Deve-se então aplicar pulsos de jato atomizado até a estabilização do ambiente, para que possam avançar e chegar com segurança até o foco principal do incêndio.
Figura 163 – Teste de teto
O teste pode ser repetido a cada dois metros, em média, se houver dúvida quanto à segurança para a progressão.
• Não aplicar água em excesso – Deve-se
evitar a aplicação de jatos em excesso, quando a temperatura estiver baixa e
não ocorrer a vaporização dentro da fumaça.
• Avaliação dentro do ambiente – Se
houver forro no ambiente, este é o momento de verificar as condições acima
dele. Se houver fumaça ou fogo acima do forro o combate deve ser realizado de fora
do ambiente.
Os bombeiros também devem estar atentos para sinais de desabamento no ambiente, tais como: trincas; rachaduras;
quedas de materiais, paredes, teto e piso falso; desabamentos anteriores, etc.
• Abertura de portas internas ou janelas
– A abertura de uma porta interna ou janela deve ser bem avaliada. Esta ação
poderá causar uma ventilação indesejada no local, levando a um aquecimento rápido
e até mesmo a um flashover. Também poderá ocasionar propagação do incêndio para
áreas até então não atingidas e expor vítimas que ainda podem estar em
segurança nestes locais.
• Combate ao foco – Localizado o foco,
faz-se o combate ou o seu confinamento, conforme a tática adotada.
Proteção da Rota de Fuga
Quando o combate exigir uma entrada demorada (se o fogo está
longe da entrada, por exemplo), pode ser necessário proteger uma rota dentro da
edificação para a saída emergencial. Isso se faz com equipes de apoio que,
igualmente equipadas com EPI e linhas de mangueira, adotam os procedimentos
possíveis, dentre os seguintes:
Monitoração da
rota de fuga
Posicionar linhas de mangueira na entrada e, se necessário,
ao longo da rota adotada pela linha de ataque para chegar ao objetivo.
Essas linhas fazem testes do teto, verificando a temperatura
e, se necessário, aplicando pulsos de jato atomizado nas paredes e na fumaça,
para evitar a inflamação.
As linhas de apoio deverão se posicionar de acordo com a determinação
do chefe da guarnição, mantendo contato via rádio ou visual com a linha de
ataque, comunicando-lhe qualquer mudança nas condições do incêndio que possa
colocá-la em risco.
Isolar áreas não
atingidas e posicionar escadas
As linhas de apoio, se possível, auxiliam no confinamento do
incêndio, fechando portas e janelas de áreas não atingidas pelo fogo.
Também orientam quanto ao posicionamento de escadas nas janelas
(se o incêndio for em edificação alta), e permanecem a postos para eventual necessidade
de resgate de uma vítima encontrada ou de bombeiro acidentado.
Aplicação de
jato neblinado contínuo
Durante o resgate de uma vítima ou bombeiro, se o ambiente começa
a degradar rapidamente, havendo risco imediato à vida, as linhas de apoio devem
formar uma barreira de água, aplicando sobre a linha vulnerável um jato
neblinado contínuo, protegendo-a durante a retirada.
O jato neblinado protege apenas enquanto dura a sua
aplicação e precisa ser mantido até a saída dos bombeiros da edificação, por
isso, é vital o fornecimento ininterrupto de água nas linhas de ataque e apoio.
Este recurso só deve ser utilizado para as situações em que
a necessidade de salvar uma vida, seja do bombeiro ou da vítima, deixa em
segundo plano a preservação da propriedade e mesmo a estabilização do incêndio.
Após a utilização desta técnica o bombeiro não deve retornar
molhado à área do incêndio.
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